O PENSAMENTO DE ARISTÓTELES.

Posted by Walther Lopes | Posted on 13:30


"AS PESSOAS DIVIDEM-SE ENTRE AQUELAS QUE POUPAM COMO SE VIVESSEM PARA SEMPRE E AQUELAS QUE GASTAM COMO SE FOSSEM MORRER AMANHÃ."

Aristóteles era natural de Estagira, na Trácia, sendo filho de Nicômaco, amigo e médico pessoal do reimacedônio Amintas III, pai de Filipe II. É provável que o interesse de Aristóteles por biologia e fisiologiadecorra da atividade médica exercida pelo pai e pelo tio, e que remontava há dez gerações. Segundo a compilação bizantina Suda, Nicômaco era descendente de Nicômaco, filho deMacaão, filho de Esculápio. Com cerca de 16 ou 17 anos partiu para Atenas, maior centro intelectual e artístico da Grécia. Como muitos outros jovens da época, foram para lá prosseguir os estudos. Duas grandes instituições disputavam à preferência dos jovens: a escola de Isócrates, que visava preparar o aluno para a vida política, e Platão e sua Academia, com preferência à ciência (episteme) como fundamento da realidade. Apesar do aviso de que, quem não conhecesse Geometria ali não deveria entrar, Aristóteles decidiu-se pela academia platônica e nela permaneceu vinte anos, até 347 a.C. , ano que morreu Platão. Com a morte do grande mestre e com a escolha do sobrinho de Platão, Espeusipo, para a chefia da academia, Aristóteles partiu para Assos com alguns ex-alunos. Dois fatos parecem se relacionar com esse episódio: Espeusipo representava uma tendência que desagradava Aristóteles, isto é, a matematização da filosofia; e Aristóteles ter-se sentido preterido (ou rejeitado), já que se julgava o mais apto para assumir a direção da Academia, no entanto não assumira devido ao fato de que não era grego, era imigrante da Macedônia. Em Assos, Aristóteles fundou um pequeno círculo filosófico com a ajuda de Hérmias, tirano local e eventual ouvinte de Platão. Lá ficou por três anos e casou-se com Pítias, sobrinha de Hérmias. Assassinado Hérmias, Aristóteles partiu para Mitilene, na ilha de Lesbos, onde realizou a maior parte das famosas investigações biológicas. No ano de 343 a.C. chamado por Filipe II, tornou-se preceptor de Alexandre, função que exerceu até 336 a.C. , quando Alexandre subiu ao trono. Neste mesmo ano, de volta a Atenas, fundou o Lykeion, origem da palavra Liceu cujos alunos ficaram conhecidos como peripatéticos (os que passeiam), nome decorrente do hábito de Aristóteles de ensinar ao ar livre, muitas vezes sob as árvores que cercavam o Liceu. Ao contrário da Academia de Platão, o Liceu privilegiava as ciências naturais. Alexandre mesmo enviava ao mestre exemplares da fauna e flora das regiões conquistadas. O trabalho cobria os campos do conhecimento clássico de então, filosofia, metafísica,lógica, ética, política, retórica, poesia, biologia, zoologia, medicina e estabeleceu as bases de tais disciplinas quanto à metodologia científica. Aristóteles dirigiu a escola até 324 a.C. , pouco depois da morte de Alexandre. Os sentimentos antimacedônicos dos atenienses voltaram-se contra ele que, sentindo-se ameaçado, deixou Atenas afirmando não permitir que a cidade cometesse um segundo crime contra a filosofia (alusão ao julgamento de Sócrates). Deixou a escola aos cuidados do principal discípulo,Teofrasto (372 a.C. - 288 a.C.) e retirou-se para Cálcis, na Eubéia. Nessa época, Aristóteles já era casado com Hérpiles, uma vez que Pítias havia falecido pouco tempo depois do assassinato de Hérmias, seu protetor. Com Hérpiles, teve uma filha e o filho Nicômaco. Morreu a 322 a.C.
O pensamento de Aristóteles surge dentro de certo desenvolvimento em três etapas do que chamamos a Filosofia do Conceito - aquela que busca um objeto estável, algo que possa ser objeto de conhecimento, e o encontra, com Sócrates, no elemento conceptual da realidade. Elemento conceptual é a parte ou aspecto dos entes que, podendo ser resumido, encaixado dentro de uma forma mental fixa, revela o que estes entes são em essência, independentemente das variações ou transformações que possam sofrer no curso de sua existência. Por exemplo, um animal qualquer, leão, cavalo, burro, por um lado tem este aspecto essencial que faz com que possamos designá-lo sempre pelo mesmo nome referindo-nos à mesma espécie; por outro lado, é evidente que não há dois cavalos iguais, dois leões iguais. Também é evidente que o cavalo não permanece o mesmo desde que nasce até que morre. E que todo o processo de geração, existência, corrupção e morte não afeta a essência ou elemento conceptual destes entes. O leão morto não passa a ser outra coisa; é um leão, essencialmente o mesmo, porém privado de existência. Distinguindo entre o que seria o aspecto essencial e o aspecto acidental ou transitório das coisas, o método de Sócrates propunha que a mente humana se preocupasse principalmente do elemento conceptual, sendo que o outro aspecto não seria propriamente matéria de conhecimento, mas apenas de sensação e opinião. Em seguida, com Platão, vemos que este elemento conceptual, já recortado, separado por Sócrates, adquire uma espécie de autonomia no sentido ontológico. Em Sócrates, a divisão entre o aspecto existencial e o conceptual era apenas técnica; era um artifício através do qual Sócrates tentava apreender um aspecto mais valioso da realidade, digno de ser investigado. Em Platão, esse aspecto separado por Sócrates é enfatizado como sendo ele mesmo a realidade, ao passo que o aspecto existencial, acidental e transitório é visto como uma espécie de tecido de aparências que nos oculta a verdadeira realidade. A passagem de Sócrates para Platão é bastante nítida; é uma diferença quase abissal. Uma coisa é dizer que vale mais a pena olhar a realidade por determinado aspecto por ser ele mais revelador; outra coisa é dizer que este aspecto é que é real e que o outro é, se não totalmente falso, pelo menos parcialmente ilusório. Podemos resumir tudo dizendo que em Sócrates a divisão dos dois mundos ou aspectos tinha um sentido metodológico, ou gnosiológico, e em Platão passa a ter um alcance ontológico. Um preceito metodológico ensina como você deve investigar as coisas; um princípio ontológico estabelece como as coisas realmente são. Muitas vezes, na história do pensamento e na história das ciências, aconteceu que preceitos metodológicos se transformaram em leis ontológicas. O caso mais recente é o do marxismo. Marx diz que devemos olhar a constituição da sociedade em primeiro lugar por sua infra-estrutura econômica e depois, em função dela, descrever os outros estratos da sociedade - leis, política, costumes, valores, artes etc. Em primeiro lugar, isto é um preceito metodológico e como tal obviamente funciona. Porém, tem isto também um alcance ontológico? Será a sociedade objetivamente constituída assim? Uma base econômica sobre a qual e e função da qual se vão criando outros estratos? Marx não deixa isto muito claro. Ele diz apenas que em última instância o fator econômico é decisivo, dando a entender que outros fatores podem ser decisivos em instâncias não últimas. Como ele não diz em parte alguma o que entende por última instância e onde termina a instância penúltima, o mais prudente é interpretar o seu preceito em sentido apenas metodológico. Porém, a tradição marxista começou a tratar esta hierarquia metodológica como se fosse um preceito ontológico. Como se a sociedade fosse construída realmente de baixo para cima, a partir de um embasamento econômico que determinaria todo o resto. E hoje esta idéia, como preceito ontológico, entrou tão fundo na cabeça das pessoas que praticamente todo mundo pensa assim, mesmo quem não gosta do marxismo... O que seria um mero preceito metodológico ou no máximo uma hipótese ontológica acaba virando uma convicção das massas que acreditam que isto tenha um fundamento científico. Também na antropologia, a idéia de que o antropólogo, quando examina diferentes culturas, deve evitar fazer uma hierarquia valorativa, como se uma cultura fosse melhor do que a outra, é um preceito metodológico. Depois, quase que implicitamente, tornou-se uma regra ontológica que diz que "não existem diferenças de valor entre as culturas ou os costumes". Um costume como a antropofagia, por exemplo, deve ser considerado tão bom - ou tão ruim - como o da adoção dos órfãos. Sempre que passamos do preceito metodológico para o ontológico existe no mínimo uma imprudência muito grande. Na passagem do socratismo para o platonismo parece ter havido isto e não sei nem se o próprio Platão e os que o cercavam se deram conta desta escorregadela, pela qual foram do metodológico ao ontológico.


E preciso cuidado para saber quando alguém está falando sobre a constituição da realidade ou sobre a melhor maneira de examiná-la. Dizer que um método é mais conveniente do que o outro nada pressupõe a respeito da realidade. O fato de que convenha examinar algo por certo lado não quer dizer que este lado seja objetivamente o mais importante.

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